sexta-feira, 21 de março de 2008


Fuçando em algumas anotações esparsas, nos arquivos perdidos no computador, acho esse breve texto sobre os Parlapas. Eu tinha começado a escrever numa dessas noites calorentas, depois de ver alguma peça da mostra de repetório dos caras. Escrevi, fiquei de rever e never more. Resolvi publicar sem colocar mais firulas, já que a idéia era fazer uma análise da mostra toda, mas resolvi engatar o foda-se e desengavetar o meu rascunho mesmo, assim meio confuso, assim incompleto, ainda assim necessário.

Eu gosto do Possolo não porque ele me faz rir, e muito. Eu gosto do Possolo e dos Parlapas porque eles representam um projeto conseqüente e coerente de teatro, por mais deliciosamente inconseqüentes que eles sejam em cena, saravá. E, ai, como faltam pessoas com essa energia desmedida em cena, desavergonhada, que se joga sem rede de proteção. Vou me permitir uma correção: o Parlapatões é um projeto teatral e cultural conseqüente e coerente. Pois sim, há uma preocupação em todos os espetáculos mostrados na mostra de repertório que não existe e nem pode existir um grupo que deixe de levantar as mangas e não pense por uma estética e por uma ética teatral. Especialmente em um país em que a política cultural não faz questão alguma de seguir no mesmo compasso da produção e da quantidade de artistas sérios, competentes e talentosos que temos aos montes.

O Prego na Testa é o melhor e o mais redondo espetáculo dos Parlapas. Ao mesmo tempo que, de relance, possa parecer um caso à parte com relação aos demais espetáculos porque conta só com o Possolo em cena e o tom é ainda mais ácido, a proposta de “Prego” é, talvez, a mais parlapatônica: corajoso, ao rever o papel do palhaço em cena. Especialmente na cena brasileira em que ele normalmente aparece como um ser etéreo, “fofo”, sorrisinhos e inofensivo. Palhaço não é inofensivo. Algumas crianças não gostam de palhaços e podemos entender por que. O palhaço, antes de tudo, incomoda. Com o nariz ele tem a liberdade de tocar na ferida. Tem licença pra matar, como Possolo faz ao descer o cacete nos bundas gordas que vão ao teatro e se divertem doidamente na Praça Roosevelt e arredores, nas bundas gordas ainda maiores que não vão à Praça Roosevelt porque tem muito mais dinheiro pra pagar um Cirque du Soleil, Teatro Abril e outras bobagens e, puta merda, dizer que perdemos o medo e a esperança sem que caia no discurso reaça e de que estamos todos perdidos.

Porque palhaço que é palhaço ainda tem uma pontinha de esperança. Não usamos mais a estrela no peito, mas o nosso nariz ainda sim é vermelho.

2 comentários:

Alan Livan Bandalheira disse...

Puta que pariu!Acabo de ler este texto enquanto sua autora toma banho aqui em casa depois de uma maratona de ensaio.Casa atulhada de caixas, verdadeiro caos. E a vontade é de chorar, de gritar, de sair correndo aqui pelo Ipiranga. Porque esse pequeno texto sobre o Parlapa que ela fez apresenta a mesma coragem que ela descreve e eu também testemunhei em Possolo. Foda, muito foda. Esse ano está sendo tão difícil, mas ao mesmo tempo maravilhoso, por tudo isso.
Saravá!

Thaís disse...

É verdade, nego. Eu já entendi que esse ano é aquele adversário difícil que te leva pra lona depois de uns 50 rounds, de briga dramática. A gente sabe que perder, nesse caso, é a nossa maior vitória. É, cara, as coisas têm sido difíceis mesmo mas eu gosto ainda mais da vida.